
“Proibir por proibir me parece o caminho mais simples e injusto.” Na opinião de Otacílio Mesquita, sócio diretor do núcleo Trance Movement, as propostas de proibição das raves não resolverão a questão do uso de drogas sintéticas pelos jovens. Para ele, os projetos de lei apresentados pelo vereador Elias Murad (na Câmara Municipal de Belo Horizonte) e pelo deputado estadual Sargento Rodrigues (na Assembléia Legislativa mineira) são o início de uma discussão que visa regulamentar os eventos de música eletrônica no Estado.
Entretanto, na visão do empresário, as propostas estão subjetivas, pois não definem precisamente o que são as festas raves. “E, principalmente, não diz o que realmente está fora dos padrões que deva ser melhorado em relação a outros eventos”, acrescenta. Otacílio afirma que, com a proibição das raves, seria o fim da cena eletrônica mineira, pois são através desses eventos que a cidade recebe artistas internacionais e é possível fazer parceria com núcleos de outros Estados e países. “Sem este intercâmbio estaríamos na contramão cultural do mundo. Seria um retrocesso, uma volta ao passado, à época da ditadura.”
Otacílio conta que o Trance Movement tem realizado fiscalizações rigorosas em seus eventos, mas ressalta que ainda falta tratar do combate aos entorpecentes nas raves. “Acho que falta fazermos um trabalho de educação e conscientização sobre o uso de drogas, e já estamos trabalhando nisso.”
Leia, a seguir, entrevista realizada por e-mail:
Gostaria de saber a opinião de vocês sobre os projetos de lei apresentados pelo vereador Elias Murad (PSDB) e pelo deputado estadual Sargento Rodrigues (PDT).
Acredito que estes projetos sejam o início de uma discussão que regulamente os eventos de música eletrônica em nossa cidade e conseqüentemente em nosso estado. A princípio, do jeito que está, acho que a lei está muito subjetiva, não definindo exatamente o que é uma festa rave. E, principalmente, não diz o que realmente está fora dos padrões que deva ser melhorado em relação a outros eventos. Os problemas que levam a esta possível proibição devem ser mais definidos. Dizer que os jovens usam drogas sintéticas por causa das raves é muito simples. É preciso destacar o que leva a estas argumentações. Aí sim podemos ter conteúdo pra discutir. Proibir por proibir me parece o caminho mais simples e injusto.
A simples proibição das raves em Minas Gerais resolverá a questão do consumo de drogas sintéticas?
Na minha opinião, não. Este projeto de lei, da forma que está, atinge principalmente os eventos profissionais, produzidos por empresas estabelecidas e que prestam contas ao poder público quando realizam seus eventos. A proibição vai incentivar os jovens a organizarem suas próprias festas de maneira amadora e perigosa. Vão migrar pra lugares afastados, sem controle dos órgãos públicos, sem atendimento médico. Sem falar que a proibição cria uma atmosfera que vai despertar a curiosidade do jovem, uma vez que este lado proibitivo sempre motiva o jovem de alguma forma.
Se o principal problema são as drogas, quais seriam as medidas a serem tomadas para combatê-las? Educação, conscientização sobre as drogas, fiscalização rígida e regulamentação das festas?
Sim!!! Como todo evento que reúne um grande número de pessoas, principalmente jovens, estes cuidados têm que existir sempre. Educar pra criar jovens que tenham consciência para escolher o melhor caminho para o seu futuro é o início de tudo, mas isso é dever do Estado e da família. Já conscientização e fiscalização fazem parte de ações que cabe muito bem aos eventos. É importante que o jovem saiba o risco que está correndo usando drogas. Saber o mal que a droga faz e o risco que corre quem usa é muito importante. Quanto mais informarmos sobre estes riscos, mais consciência o jovem vai passar a ter. E a fiscalização é importante para inibir o mau elemento que vê nas festas um ambiente fácil pra promover seus atos ilícitos. Este controle e fiscalização são fundamentais pra privilegiar o bom freqüentador das festas. Aquele que esta lá por amor à música e ao ambiente de paz que existe nos eventos de música eletrônica.
O deputado Sarg. Rodrigues afirma, em seu projeto de lei, que as raves se tornaram "palco de violência e consumo de drogas". O que tem a opinar sobre isso?
Acho que deve haver um engano. Festas de música eletrônica são palcos de paz e harmonia. Se existe um tipo de evento com baixos índices de violência é o de música eletrônica. Sobre o consumo de drogas, antes de tudo, acredito ser um problema cultural existente em todos os pontos de aglomeração jovem, devemos fiscalizar e vigiar pra não permitir. Isto deve ser feito.
O Trance Movement foi procurado pelos (ou procurou os) senhores Elias Murad e Sarg. Rodrigues para discutir este assunto?
Procuramos o Dr. Elias Murad e fomos muito bem recebidos por ele. Ele se mostrou solidário à nossa intenção de regulamentar os eventos de música eletrônica, a fim de que as empresas profissionais do mercado tenham condição de trabalhar e, principalmente, ajudar na conscientização dos males do uso de drogas pelo jovem.
Quais seriam as conseqüências de tal proibição para a cena eletrônica mineira?
Seria o fim!! Nos grandes eventos e festivais temos a oportunidade de trazer grandes artistas, investir em infra-estrutura e principalmente fazer parceria com grandes núcleos de eventos de outros Estados e países pra trazer o que há de melhor da música eletrônica no mundo. Sem este intercâmbio estaríamos na contramão cultural do mundo. Seria um retrocesso, uma volta ao passado, à época da ditadura.
A alternativa será realizar festas em clubes?
Já fazemos eventos em clubes. Trabalhando apenas nos clubes, vamos ter limitações de data, capacidade e agenda que não resolveriam nunca o problema. Como disse na resposta anterior.
Você se sentiram prejudicados com as reportagens do jornal – principalmente as últimas publicadas no domingo em O Tempo (clique aqui para ler)?
De certa forma sim. Penso que estas últimas matérias não pesquisaram a fundo o movimento eletrônico e suas qualidades. Generalizaram muito o assunto das drogas e não procuram ouvir da mesma forma os dois lados envolvidos.
De modo geral, a imprensa está cobrindo o tema de maneira correta?
Vale a mesma resposta anterior.
Quais ações o Trance Movement têm feito e continuará fazendo para combater o consumo de drogas nas raves?
Mesmo antes de toda esta polêmica, sempre nos preocupamos com a fiscalização e o policiamento dentro dos nossos eventos. Fazemos uma revista rigorosa, só permitimos a entrada de maiores de 18 anos. Tanto a Polícia Militar quanto o Juizado de Menores, acompanham nosso trabalho de revista e conferência de documentos na entrada do evento. Montamos delegacia da Polícia Civil dentro do evento, posto de apoio da Polícia Militar e Juizado de Menores também. A polícia tem acesso livre dentro do evento. Na semana que antecede o evento, nós organizadores, nos reunimos com o poder público do evento (juiz, policia militar, policia civil, Juizado de Menores e donos do local) para deliberar a melhor forma de atuar no evento. Agimos sempre com a determinação das autoridades e com sua supervisão. Agora acho que falta fazermos um trabalho de educação e conscientização sobre o uso de drogas, e já estamos trabalhando nisso.
Quais os planos do Trance Movement para 2008? Há festas pré-agendadas para o próximo ano? Elas serão ao ar livre?
Enquanto não temos uma definição sobre estes problemas, vamos manter nosso calendário. E a maior parte dele é de eventos open air. A programação: Pacha, Chemical Music, Tribe, Festival Cachoeira Alta, Circuito Peugeot de Música Eletrônica, XXXperience, Creamfields, Warung Tour 2008, Trance Movement Edição Especial 7 Anos.
O DJ Anderson Noise afirmou ao Psyte que o problema das drogas é uma questão cultural e que ela está presente em todos os lugares (baile funk, pagode, churrascos, clubes, festinhas de amigos). Você concorda com essa opinião? Por quê?
Sim! Antes de a música eletrônica existir as drogas já estavam aí. É muito fácil fazer das festas de música eletrônica um culpado para um problema que faz parte da nossa cultura há séculos.
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